Juros menores: especialistas avaliam o novo cenário

O ambiente de investimentos em 2017 sinaliza que será cada vez mais difícil para os fundos de pensão brasileiros pensarem em  bater metas atuariais apenas com a alocação tradicional em renda fixa, o que ocorre num momento de grande concentração dos seus ativos em títulos públicos. O vencimento de NTN-Bs e NTN-Cs no primeiro semestre deste ano poderá ser um momento relevante para muitas Entidades Fechadas de Previdência Complementar definirem os rumos de suas carteiras de renda fixa. Considerando um juro atuarial de 5,5%, a rentabilidade dos papéis com prazo de 12 meses “está na linha d'água” e, somado o custo das taxas administrativas dos planos, esse retorno cai um pouco mais, segundo analisa o especialista em gestão de ativos da Eletros, Jair Ribeiro.
 
“As taxas de CDI, Selic e NTNs - curtas e longas – apontam chances limitadas de superar o juro atuarial, então eu diria que a  situação em 2017 é  delicada para quem não fez os necessários movimentos aproveitando o fenômeno global de queda dos riscos soberanos registrados até agora”. Esse fenômeno internacional, que favoreceu a alocação em ativos de risco desde fevereiro de 2016, e que muito ajudou os países emergentes, pode estar no limite, avalia o especialista. “Esse movimento provocou a queda do risco Brasil de 500 pontos para 220 pontos e  melhorou a situação dos ativos de risco, tornando a renda variável uma alternativa novamente atraente e permitindo que as entidades acumulassem alguma gordura”.
 
Mas, levando em conta um cenário interno em que a macroeconomia ainda produz estimativas incertas, ele considera que essa janela, ao menos por enquanto, exige cuidado. Diversas entidades souberam fazer alocações estratégicas em renda variável de modo a acumular gordura para enfrentar 2017 com certo conforto e talvez também 2018, que deverá ser um ano crítico. “Será preciso buscar novas opções fora da renda fixa tradicional mas sem necessariamente assumir riscos por enquanto, até porque o juro em queda não traz como consequência obrigatória a alta da bolsa”, afirma Ribeiro.
 

 

Mix cuidadoso - As EFPCs estão bem posicionadas em títulos públicos e contam com a experiência de ciclos anteriores de queda dos juros, lembra o coordenador da Comissão Técnica Nacional de Investimentos da Abrapp e diretor de Investimentos e Finanças da Valia, Maurício Wanderley. Uma equação que integre um pouco mais de risco na renda fixa e talvez um pouco mais de renda variável e mesmo um aumento na alocação em ativos de crédito poderá trazer oportunidades, pondera Wanderley. No caso específico da Valia, a decisão sobre o ritmo de investimento em produtos como private equity, por exemplo, ainda vai depender da normalização dos mercados, que já dá sinais de ter começado, segundo o diretor: “A crise atrasou os desinvestimentos em PE, então precisamos esperar desinvestir para decidir o que fazer mais adiante, mas por enquanto alcançamos as metas a que nos propusemos nesses ativos”.
 
Com vencimentos em NTN-Cs agora no primeiro semestre, a Valia já havia providenciado a rolagem e o alongamento de prazos desses papéis. Tanto para os estoques de seu plano BD, maduro, quanto para os estoques dos demais planos a questão está resolvida, informa o diretor. “Aproveitamos bem a abertura das taxas e o retorno da renda variável aumentou marginalmente”. A Valia reúne, em todos os seus planos, um patrimônio da ordem de R$ 21,255 bilhões. A entidade estuda como se posicionar mais para a frente em relação à alocação dos novos recursos que entrarem e o diretor ressalta que o juro real na ponta curta ainda está suficientemente alto. “Para o dinheiro novo, no entanto, vamos ter que nos defrontar com a realidade do juro menor”.
 
O maior desafio, explica Wanderley, será como equacionar a renda fixa nos planos de Contribuição Variável (CVs) da fundação, que somam cerca de R$ 10 bilhões. “Aí há obrigações de risco por morte e invalidez, benefícios de renda vitalícia, entre outros, e a parte CD desses planos, onde estão os perfis; na verdade os CVs são compostos por vários pedaços diferentes”. A decisão, porém, dependerá muito também dos movimentos dos participantes nos perfis de invetimento. Atualmente, a entidade mantém perfis com percentuais de 20% e de 40% em renda variável, e permite trocas de perfil a cada 12 meses. Por enquanto, as migrações tem sido discretas.
 
 
Retorno cadente - Com os títulos públicos pré-fixados para vencimento em  12 meses pagando taxa nominal de 9,55% ( LTN de 12 meses) e inflação de 4,60% (IPCA de 12 meses segundo pesquisa Focus divulgada no dia 10 de abril),  o juro real pago pela LTN é de 4,73%, observa Ribeiro. O que significa que o retorno proporcionado pelas LTNs com referência na Selic projetada em 12 meses cairia para 4,21% ao ano depois de excluída a taxa de administração do plano de benefício de 0,5% ao ano, “o que está muito abaixo da grande maioria das taxas atuariais adotadas pelas entidades”.
 
Na Eletros, a carteira já passou por um movimento de ajuste e está adequadamente posicionada, diz Ribeiro. “Mantivemos o percentual de 15% em média em renda variável porque era uma alocação estratégica, baseada em ALM, e não há perspectivas de ampliá-lo, mas já há uma margem boa de gordura para enfrentar a conjuntura de queda no retorno da renda fixa”. A decisão de aumentar alocação em renda variável agora é complexa, lembra Jair Ribeiro: “o movimento global de redução dos prêmio de risco já dura 14 meses e não se sabe qual será sua extensão”.  ( Martha E. Corazza )
Os investimentos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar ofereceram um retorno consolidado acima das metas atuariais no período de 14 anos,  compreendido entre 2003 e 2016, com uma rentabilidade de 565,81 % contra a variação de 428,54% da TMA/TJP.  

 

Além disso, essas carteiras também obtiveram resultados superiores ao CDI, cuja variação foi de 455,84% no período, e do Ibovespa, que somou retorno de 434,64%.

 

As conclusões são do novo estudo elaborado pelo Núcleo Técnico da Abrapp, que analisa a rentabilidade das diversas carteiras de acordo com o desempenho de cada classe de ativo no período de 2003 a 2016. O trabalho mostra a rentabilidade ponderada, o que significa que as fundações cujos ativos somam valores maiores acabam tendo um peso maior nos resultados finais. Ele foi dividido em duas partes: a primeira mostra os resultados segmento a segmento e a segunda revela o desempenho dos investimentos  vis a vis os indicadores de mercado.

 

Ganhos em 2016 – Ao avaliar o ano de 2016 isoladamente,  o estudo destaca o desempenho positivo e o fato de que, pela primeira vez em quatro anos, as EFPCs superaram tanto sua meta atuarial quanto o CDI. A  rentabilidade consolidada ficou em 14,56%, acima da TMA/TJP, de 13,44%, e superior à variação do CDI, que foi de 14,01%.  

 

Esse resultado foi influenciado pelo retorno positivo das carteiras de renda variável , que registraram rentabilidade de 15,8% - a melhor entre as diversas classes de ativos, algo que não ocorria desde 2009. A exuberância do desempenho da bolsa levou o Ibovespa a atingir valorização de 38,94%  e o IbrX ganhou 36,7%. Depois de passar seis anos na “lanterna” desse ranking, o Ibovespa teve a maior rentabilidade do ano.

 

As apostas das entidades no segmento de imóveis sofreram uma forte reversão no ano passado, mas os ganhos acumulados ao longo do tempo são expressivos. Em 2016, a rentabilidade dessas carteiras encolheu para apenas 6,88% , o menor retorno de toda a série histórica observada desde 2003.  Já nos três cortes de tempo analisados, os imóveis lideram o ranking e apontam os maiores retornos:  101,88% em cinco anos; 526,52% em dez anos e 994,58% no período entre 2003 e 2006. Este último percentual, naturalmente, é o que deve ser visto com mais atenção, por se coadunar com a natureza de longo prazo das entidades. ( Martha E. Corazza )