Justiça autoriza aposentado a deduzir do IR contribuições extraordinárias

 Aposentados e pensionistas têm obtido no Judiciário o direito de deduzir da base de cálculo do Imposto de Renda contribuições extraordinárias exigidas por fundos de pensão e de previdência privada. As decisões autorizam a medida fundamentadas na Lei nº 9.532, de 1997, que estabelece o abatimento – o que para a Receita Federal só valeria para as contribuições normais.

A questão ganhou importância com os planos de equacionamento de déficits acumulados adotados pelos grandes fundos de pensão do país – Petros, Funcef e Postalis. Os três, ao lado da Previ, estiveram no centro das investigações da Operação Greenfield, deflagrada em 2016 pela Polícia Federal e Ministério Público Federal para apurar crimes de gestão temerária e fraudulenta. A estimativa é que os prejuízos superaram a cifra de R$ 54 bilhões.

Hoje, o artigo 11 da Lei nº 9.532, de 1997, autoriza “as deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada”, limitadas a 12% do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de ajuste anual de rendimentos. No entanto, para a Receita Federal, não entrariam as extraordinárias.

O entendimento está na Solução de Consulta nº 354, editada em 2017 pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit). Pelo texto, “apenas as contribuições normais (aquelas que se destinam ao custeio de benefícios) às entidades fechadas de previdência privada domiciliadas no Brasil são dedutíveis do imposto sobre a renda de pessoa física”.

Com as contribuições extraordinárias exigidas pelos grandes fundos, aposentados e pensionistas passaram a recorrer à Justiça. Para repassar a conta às patrocinadoras – Petrobras, Caixa Econômica Federal (CEF) e Correios – ou reduzir o prejuízo por meio da dedução dos valores do Imposto de Renda. “Mais pessoas passaram a se sujeitar ao pagamento de contribuições extraordinárias e, com isso, cresceu a litigância desse assunto”, explica a advogada Ana Cláudia Utumi.

De acordo com o advogado Gabriel Britto, do escritório Jund Advogados Associados, a Receita Federal vem cobrando o Imposto de Renda sobre o valor descontado mensalmente a título de contribuição extraordinária. “Apesar desse valor não representar qualquer acréscimo patrimonial ao contribuinte”, diz. “Mas temos recorrido à Justiça e conseguido decisões favoráveis aos nossos clientes”, complementa.

Um dos processos foi analisado pelo 5º Juizado Especial Federal do Rio de Janeiro (nº 5073867-34.20 21.4.02.5101). A juíza Simone de Fátima Diniz Bretas julgou procedente o pedido, condenando a União/Fazenda Nacional a deduzir o valor das contribuições extraordinárias da base de cálculo do Imposto de Renda e a restituir os valores recolhidos indevidamente.

Gabriel Britto calcula que o montante a ser devolvido supera a cifra dos R$ 20,5 mil. O valor é referente ao período de março de 2018 a dezembro de 2020.

Citando entendimento da Turma Nacional de Uniformização (TNU) favorável a aposentados e pensionistas, a juíza federal Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni, do Juizado Especial Federal de São Paulo, também decidiu no mesmo sentido (processo nº 0067608-41.2019.4.03.6301). O caso envolve a Funcef.

Para a TNU, “as contribuições do assistido destinadas ao saneamento das finanças de entidade fechada de previdência privada podem ser deduzidas da base de cálculo do imposto sobre a renda, mas dentro do limite legalmente previsto (artigo 11 da Lei nº 9.532/97)”.

O advogado André Luiz, do escritório CTM Advogados, afirma que, nesses casos, é recomendável ter “salvaguarda judicial”. “É preciso que se faça análise cuidadosa porque a Receita Federal não tem observado as decisões do Judiciário. Tem que ter decisão judicial porque quando [o aposentado ou pensionista] é autuado, cobra-se multa e juros e a restituição é retida”, diz.

A dedução, para a advogada Maria Inês Murgel, do escritório JCM Advogados Associados, é um incentivo para as pessoas fazerem poupança previdenciária. “As contribuições extraordinárias possuem a mesma natureza da normal. Mas é determinada pelo fundo de extraordinária para garantir a aposentadoria e por tempo limitado”, diz.

Para resolver o problema, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 4.016/2020, que altera a Lei nº 9.532/1997, para dispor expressamente sobre a possibilidade da dedução das contribuições extraordinárias para os planos de benefícios de entidade fechada de previdência complementar.

Em nota enviada ao Valor, a Receita Federal informa que “não tivemos ainda nenhuma mudança na legislação que permita esse tipo de dedução”. Fonte: Valor Econômico – Por Gilmara Santos — De São Paulo 09/11/2021 (VALOR - FCR NEWS)